sexta-feira, 13 de fevereiro de 2015

Exercício didático sobre o funcionamento do novo Campeonato Argentino


Racing: o último dos campeões dos saudosos "torneos cortos" (Foto: La Redó)

Por: Jhon Tedeschi (@jhontedeschi)

No final da tarde desta sexta-feira (13) começa mais um Campeonato Argentino em nossas vidas. Parece uma grande ironia o certame se iniciar em uma “sexta-feira 13”, mas a verdade é que a mudança radical no regulamento coloca em xeque a efetividade na organização do campeonato e, acima de tudo, a qualidade técnica do mesmo.

Serão 30 equipes participantes, as 20 que militavam na elite até o segundo semestre de 2014, e os 10 clubes que ascenderam do Torneo de Transición Primera B Nacional. Estão extintos os torneios curtos (Apertura/Clausura e Inicial/Final), que já eram marca registrada do fútbol argentino, e o calendário, que até então era o “europeu”, será o do “ano-calendário” – o campeonato começa hoje, e terminará apenas em dezembro.

Os clubes tiveram cerca de 9 meses para se adaptar a esta nova realidade, uma vez que o anúncio do novo calendário foi feito ainda no final de abril de 2014. O último campeonato disputado neste modelo, de um torneio único, havia sido na distante temporada de 1966 – nas temporadas 1985/85 e 1989/90 também foram disputados torneios únicos, mas respeitando o calendário “europeu”.

O leitor deve estar se perguntando o porquê da AFA mudar um regulamento que era aparentemente efetivo – apesar dos pesares –, para inchar um campeonato na elite. A resposta é simples: medida populista. A organização e quem manda no futebol na Argentina é, via de regra, gente diretamente ligada ao governo Kirchner, que visa a aumentar sua popularidade apelando para a medieval política do “pão e circo”.

O novo modelo de disputa

Conforme o exposto anteriormente, os torneios curtos (infelizmente) foram extintos. As 30 equipes disputarão um torneio único, onde todos se enfrentarão, apenas uma vez. Na rodada 24, os clássicos serão repetidos, apenas com a inversão do mando de campo, como medida bem discutível de nivelamento técnico. O campeonato terá um hiato entre 31 de maio e 12 de julho, para a disputa da Copa América, no Chile. A fase regular começa agora, em fevereiro, e se encerra na primeira semana de novembro.

O campeão, obviamente, será o que acumular mais pontos ao longo do campeonato. Pelo menos isso não mudou. Ao contrário dos anos anteriores, quando a classificação para as copas internacionais se dava pela soma dos pontos dos torneios curtos ao longo do ano, e não da temporada, em 2015 teremos Liguillas seletivas para a Libertadores da América e a Copa Sul-Americana. As Liguillas serão disputadas nos meses de novembro e dezembro.

Aparentemente a coisa é simples, mas vamos ver que não é bem assim. Campeão e vice estão classificados para a fase de grupos da Libertadores 2016, até aí tudo OK. Como a Argentina tem 5 vagas para La Copa, restam 3, e uma delas será do campeão da Liguilla pré-Libertadores. Esta seletiva será um play-off simples, onde jogarão o 3º vs 6º e 4º vs 5º colocados na fase regular do campeonato. As semi-finais serão em jogo único e a final em duas partidas.

O derrotado na final da Liguilla pré-Libertadores estará automaticamente classificado para a Copa Sul-Americana 2016. Restarão 5 vagas, 4 delas em disputa na Liguilla pré-Sul-Americana. Entraremos nos detalhes quanto a fórmula de disputa desta seletiva quando for pertinente, mas é importante saber que ela envolverá do 7º ao 18º colocados na fase regular, além dos perdedores das semi-finais da Liguilla pré-Libertadores.

Quanto ao rebaixamento, seguimos com a maravilhosa “tabla de descenso”, que medirá o promedio (quociente entre o número de pontos e o número de jogos) das equipes nas últimas quatro (!) temporadas (a saber: 2012/13, 2013/14, Torneo de Transición 2014 e 2015). Serão apenas duas equipes rebaixadas ao final da temporada.

Como se reforçaram as principais equipes?

Sabendo das agruras que um campeonato longo oferece, as maiores equipes buscaram reforçar bem seus elencos, ao passo que as equipes menores perderam seus principais jogadores e precisaram ser muito precisas nos movimentos de garimpar talentos para seus grupos. Os 5 grandes, por exemplo, foram forte ao mercado, contratando com qualidade – no caso do Boca Juniors, também em quantidade. Até porque 4 deles (à exceção do Independiente) estarão na disputa da Libertadores da América neste ano.

E começamos falando justamente do Boca Juniors, que anunciou nada menos que 9 novos jogadores, apesar de ter perdido alguns outros tantos. Os principais reforços são os ótimos Pablo Pérez (volante) e Guillermo Sara (goleiro), que retornam do futebol espanhol, o meia uruguaio Nicolás Lodeiro, que estava no Corinthians, e o centroavante ítalo-argentino Pablo Daniel Osvaldo, ex-Internazionale/ITA.

O River Plate, campeão da Sul-Americana e da Recopa, empolgou no início da janela de transferências acertando o retorno de Pablo Aimar, que logo se lesionou e dificilmente ficará tão cedo à disposição de Marcelo Gallardo. Os millonarios não perderam nenhum grande valor, e reforçaram seu grupo com o promissor Gonzalo Pity Martínez, que chegou do Huracán, e com o uruguaio Camilo Mayada, destaque do Danubio/URU.

Os rivais de Avellaneda tiveram posturas distintas, mas com uma coisa em comum: ambos perderam muitos jogadores importantes.O Racing, atual campeão argentino, perdeu um de seus principais jogadores, Ricardo Centurión, que foi para o São Paulo. Em contrapartida, chegou o paraguaio Óscar Romero, bom valor do Cerro Porteño/PAR.

Já o Independiente perdeu muitos jogadores a nível de grupo, a se destacar o meia Federico Insúa e o atacante Sebastián Penco, que foram para o futebol colombiano, mas contratou o ótimo atacante Lucas Albertengo, ex-Atlético Rafaela, e os experientes defensores Emiliano Papa e Mauricio Victorino.

Defensor do título maior do continente nesta temporada, o San Lorenzo se reforçou com dois nomes que, particularmente, são muito interessantes. Um é o volante Franco Mussis, que estava no Genoa, mas foi muito bem no Gimnasia y Esgrima/LP, e o outro é o meia Sebastián Blanco, revelado pelo Lanús e que atuava no futebol inglês. Dos jogadores que saíram, o mais utilizado era o defensor Walter Kannemann, contratado pelo Atlas/MÉX.

E as menores equipes, como se comportaram na pré-temporada?

Temos dois grupos das chamadas “menores equipes”, que são os clubes importantes, de certo porte e que já militavam na elite do fútbol argentino, e os “quadros chicos”, sem grande estrutura ou poderio financeiro, que certamente enfrentarão alguma dificuldade ao longo da temporada. Entre os primeiros, destacam-se Estudiantes/LP e Huracán, que estão na Libertadores da América, Vélez Sarsfield, Newell’s Old Boys e Rosario Central.

O Huracán surpreendeu o continente ao conquistar a Copa Argentina no ano passado, mas, acima de tudo, ao derrubar o Alianza Lima/PER na 1ª fase da Libertadores. O elenco perdeu um de seus melhores jogadores, Pity Martínez, negociado com o River Plate. O outro argentino que passou pela fase eliminatória da Libertadores, o Estudiantes/LP, também perdeu um de seus principais atletas, Joaquín Correa, que foi para o futebol italiano, mas três nomes de destacam entre os reforços: o uruguaio Álvaro Pereira, e os jovens revelados pelo Boca Juniors, Juan Sánchez Miño e Luciano Acosta.

Os clubes de Rosario não tiveram tanto destaque no mercado de transferências, além de não terem times tão promissores para a temporada 2015, tanto é que os principais nomes são os treinadores; Américo Gallego, do lado do Newell’s, e Eduardo Coudet, do lado do Central. O Vélez Sarsfield segue apostando forte nas categorias de base, mas repatriou os experientes Hernán Pellerano e Leandro Somoza, além da contratação de Mariano Pavone, em reposição à saída de Lucas Pratto, que foi para o Atlético Mineiro.

Das outras 20 equipes, destacaria as participações do Quilmes (se reforçou com Bieler, Buonanotte e Tito Ramírez), Tigre (teve o retorno de Echeverría e as chegadas de Pelletieri e Neumann Morales), Colón (contratações de Clemente Rodríguez e Pablo Ledesma, ambos ex-Boca Juniors), Lanús (apesar do desmanche teve os retornos de Fritzler e Leto) e Banfield (chegadas de Viatri, Civelli e Maxi Calzada) no mercado.

Quem briga pelo título? Quem vai lutar para não cair?

Os torneios curtos tinham o interessante ingrediente da imprevisibilidade, pois qualquer equipe poderia aproveitar uma boa fase e arrancar para o título. Este ano, com um campeonato mais longo, o número de candidatos ficou bem restrito, apesar do equilíbrio entre as maiores equipes.

Por ter se reforçado melhor que seus concorrentes diretos, é inevitável apontar o Boca Juniors como principal candidato ao título. Se o técnico Rodolfo Arruabarrena conseguir encaixar as peças na sua bem ajustada estrutura montada na temporada passada, os xeneizes chegam fortes para a disputa do título argentino e também da Libertadores da América.

Os maiores concorrentes do Boca Juniors serão os arqui-rivais River Plate e Independiente, que são os clubes que mostram estrutura técnica para confrontar o clube da Ribera. Os bem organizados taticamente Estudiantes/LP, Racing e San Lorenzo vão correr por fora, sendo favoritos às vagas na Liguilla pré-Libertadores.

Como tivemos muitos acessos na temporada passada, os candidatos ao rebaixamento também não serão poucos. O Crucero del Norte, pela estrutura reduzida, e pela distância geográfica em relação às demais equipes, é ficha 1 para o descenso. Aldosivi, Defensa y Justicia, Sarmiento e Temperley, desacostumados à elite, também deverão sofrer durante o ano. Atlético de Rafaela, Olimpo, Tigre, Quilmes e Banfield, com pontuação baixa acumulada ao longo das últimas temporadas, precisarão ficar de olho nos promedios, para evitar uma surpresa desagradável ao final do ano.

A rodada inaugural do Campeonato Argentino 2015 começa nesta sexta-feira (13), com duas partidas. O primeiro jogo, às 19h (horário brasileiro de verão), será entre Vélez Sarsfield e Aldosivi, no José Amalfitani. Na sequência, às 22h10, o Racing começa a defesa do título do último torneio recebendo o Rosario Central, em Avellaneda - muito bom jogo, por sinal. Abaixo, os demais jogos da rodada (todos considerando o horário brasileiro de verão):

14/02, 18h, Nuevo Gasómetro - San Lorenzo vs Colón
14/02, 18h, Juan Carmelo Zerillo (Del Bosque) - Gimnasia y Esgrima/LP vs Defensa y Justicia
14/02, 20h15, Malvinas Argentinas - Godoy Cruz vs San Martín/SJ
14/02, 21h, Marcelo Bielsa (Coloso del Parque) - Newell's Old Boys vs Independiente
14/02, 21h30, Florencio Sola - Banfield vs Temperley
14/02, 22h30, Comandante Andrés Guacuarí - Crucero del Norte vs Tigre
15/02, 18h, 15 de Abril - Unión/SF vs Huracán
15/02, 18h, Centenario de Quilmes - Quilmes vs Lanús
15/02, 19h15, La Bombonera - Boca Juniors vs Olimpo
15/02, 20h10, La Paternal - Argentinos Juniors vs Atlético de Rafaela
15/02, 22h30, Eva Perón - Sarmiento vs River Plate
16/02, 19h, El Viaducto - Arsenal vs Estudiantes/LP
16/02, 22h10, Mario Alberto Kempes - Belgrano vs Nueva Chicago

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